Por David W Brown. Originalmente publicado no Mental Floss.

Descrevendo o sistema de fios que integram a Internet, Neal Stepheson certa vez comparou a Terra a uma placa mãe. Desde cabos telefônicos suspensos em postes a cabos de fibra ótica enterrados, estamos rodeados de evidências de que, num nível básico, a Internet é realmente apenas um espaguete formado por fios realmente longos. Mas o que nós vemos é apenas uma pequena parte da forma física da rede. O resto pode ser encontrado na mais fria profundeza do oceano. Veja dez coisas que talvez você não saiba sobre o sistema de cabos submarinos da Internet.
1. A instalação dos cabos é lenta, tediosa e trabalhosa

Foto: Reuters/Landov

99% dos dados internacionais são transmitidos por fios submersos no oceano, chamados cabos de comunicação submarina. No total, eles têm centenas de milhares de quilômetros de comprimento e podem estar tão abaixo do nível do mar quanto o Everest é alto. Os cabos são instalados por navios especiais chamados lança-cabos. É mais do que uma questão de soltar os cabos com âncoras amarradas a eles – os cabos devem se manter nas superfícies planas do fundo do mar, e é importante evitar recifes de corais, navios afundados, leitos de peixes, outros habitats naturais e obstruções em geral. O diâmetro de um cabo de águas rasas é aproximadamente o mesmo de uma lata de refrigerante, enquanto os cabos de águas profundas são muito mais finos – aproximadamente a espessura de uma canetinha. Essa diferença está relacionada à vulnerabilidade – não há muita coisa acontecendo a 8.000 metros abaixo do nível do mar. Consequentemente, há menos necessidade de cabos com proteção galvanizada. Os cabos que ficam em áreas rasas são enterrados com a ajuda de jatos d’água de alta pressão. Embora o preço por quilômetro de instalação mude de acordo com o comprimento total e destino, passar cabos pelo oceano invariavelmente custa centenas de milhões de dólares.

2. Tubarões estão tentando comer a internet

Não há um acordo do porquê, exatamente, tubarões gostam de mastigar cabos de comunicação submarinos. Talvez tenha algo a ver com os campos magnéticos. Talvez eles sejam apenas curiosos. Talvez eles estejam tentando desestabilizar nossa infraestrutura de comunicação antes de montar um ataque terrestre (minha teoria). O fato é que os tubarões estão mastigando e, por vezes, danificando a Internet. Em resposta, empresas como a Google estão protegendo os cabos com arames a prova de tubarões.

3. A internet submarina é tão vulnerável quanto a subterrânea
Parece que, a cada dois anos, algum trabalhador da construção bem intencionado engata a marcha no trator e derruba a Netflix em um continente. Enquanto o oceano está livre de equipamentos de construção que possam se combinar para formar o Devastador, há muitas ameaças aquáticas para os cabos submarinos. Tubarões à parte, a Internet está sempre em risco de ser interrompida por âncoras de barcos, ser arrastada por navios de pesca ou derrubada por desastres naturais. Uma empresa situada em Toronto, no Canadá, propôs passar um cabo através do Ártico para conectar Tóquio e Londres. Isso já foi considerado impossível, mas as mudanças climáticas e o derretimento das calotas polares colocaram essa proposta na categoria de factível, mas muita cara.

4. Conectar o mundo através de cabos no fundo do mar não é exatamente novo
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Em 1854, começou a instalação do primeiro cabo telegráfico transatlântico, que conectou a Terra Nova e a Irlanda. Quatro anos depois, a primeira transmissão foi enviada: “Laws, o Whitehouse recebeu cinco minutos de sinal. Os sinais da bobina está fraco demais para retransmitir. Tente conduzir devagar e regularmente. Eu coloquei a polia intermediária. Responda por bobinas” (‘Whitehouse’ se refere a Wildman Whitehouse, o chefe eletricista da Companhia Telegráfica do Atlântico) Isso não é um relato muito inspirador. Um contexto histórico: durante esses quatro anos da construção da rede de cabos, Charles Dickens ainda escrevia novelas, Walt Whitman publicou Folhas de Relva, um pequeno povoado chamado Dallas foi formalmente criado no Texas e Abraham Lincoln, candidato ao Senado americano, deu o seu discurso da Casa dividida.

5. Espiões amam cabos submarinos
No auge da Guerra Fria, a União Soviética normalmente transmitia mensagens fracamente codificadas entre duas das suas principais bases navais. Criptografia forte era um incômodo – e também um exagero – para os Oficiais Soviéticos. Como as bases estavam diretamente ligadas por um cabo submarino em águas soviéticas, os americanos não arriscariam a III Guerra Mundial tentando, de alguma forma, acessar e quebrar esse cabo. Eles não contavam com o USS Halibut, um submarino especialmente equipado, capaz de deslizar pelas defesas soviéticas. O submarino americano encontrou o cabo, instalou um grampo gigante e voltava mensalmente para reunir as transmissões gravadas. Essa operação, chamada de IVY BELLS, mais tarde foi comprometida por um ex-analista da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês), chamado Ronald Pelton, que vendeu informações sobre a missão para os soviéticos. Hoje, grampear cabos submarinos de comunicações é o procedimento padrão das agências de espionagem.

6. Os governos estão atentos aos cabos submarinos para evitar ataques de espiões
No que diz respeito à espionagem eletrônica, uma grande vantagem dos Estados Unidos é o papel chave que seus cientistas, engenheiros e corporações têm na construção da infraestrutura das telecomunicações globais. As principais linhas de dados tendem a cruzar as fronteiras americanas, o que torna grampear dados muito fácil. Quando os documentos vazados pelo ex-analista Edward Snowden vieram à tona, muitos países ficaram indignados com a extensão da interceptação de dados estrangeiros pela espionagem americana. Como resultado, alguns países estão reconsiderando a infraestrutura da própria Internet. O Brasil, por exemplo, lançou um projeto para construir uma rede de cabos de comunicação até Portugal, que, além de ignorar os Estados Unidos inteiramente, também exclui especificamente as empresas americanas de se envolver no processo.

7. Cabos de comunicações submarinos são mais rápidos e mais baratos que satélites
Há bem mais de mil satélites em órbita, e estamos desembarcando sondas em cometas e planejando missões à Marte. Nós estamos vivendo o futuro! Parece evidente que o espaço seria a melhor maneira de passar “fios” virtuais de Internet do que o nosso método atual de passar vários cabos longos pelo fundo do oceano com tubarões, cortes e atritos. Certamente, os satélites seriam uma opção melhor do que uma tecnologia inventada antes do telefone, não? Ao que parece, não (ou ainda não). Apesar de cabos de fibra ótica e satélites de comunicações terem sido desenvolvidos em 1960, os satélites têm um problema duplo: latência e perda de bits. Enviar e receber sinais para e a partir do espaço leva tempo. Enquanto isso, os cientistas têm desenvolvido fibras óticas que podem transmitir dados a 99,7% da velocidade da luz. Para se ter uma ideia de como seria a internet sem cabos submarinos, visite a Antártica, o único continente sem conexão física com a rede. O continente depende de satélites e a largura da banda é limitada, o que não é um problema pequeno quando se fala em dados importantes das pesquisas climáticas realizadas por lá. Hoje, as estações na Antártica produzem mais dados do que podem transmitir para o espaço.

8. Esqueça a ciberguerra – para paralisar a Internet, você precisa de equipamento de mergulho e um par de cortadores de fio
A boa notícia é que é difícil cortar um cabo de comunicação submarino, mesmo que apenas por causa dos milhares de volts letais que passam por eles. A má notícia é que é possível, como visto no Egito, em 2013. Há, no norte de Alexandria, homens com roupas de mergulho que foram apreendidos ao, intencionalmente, cortar o cabo 4 do Sudeste Asiática, Oriente Médio e Europa Ocidental, que passa por 12.500 milhas e conecta três continentes. A velocidade da Internet no Egito foi reduzida em 60% até que fosse efetuado o reparo.

9. Cabos submarinos não são fáceis de reparar, mas depois de 150 anos aprendemos um truque ou dois
Se você acha que a substituição de um cabo Ethernet que não chega atrás da sua mesa é um problema, tente substituir uma mangueira de jardim quebrada no fundo do oceano. Quando um cabo submarino está quebrado, navios de reparo especiais são enviados. Se o cabo está localizado em águas rasas, robôs são implantados para agarrar o cabo e transportá-lo para a superfície. Se o cabo está em águas profundas (6.500 pés ou mais), são enviados barcos menores, feitos especialmente para pegar os cabos e içá-los para remendar. Para facilitar as coisas, por vezes, o cabo danificado é cortado em dois e navios elevam cada extremidade separadamente para remendar fora da água.

10. A estrutura da Internet submarina é feita para durar 25 anos
Desde 2014, há 285 cabos de comunicação no fundo do oceano e 22 deles ainda não estão em uso. Eles são chamados de “cabos apagados” (uma vez ligados, são chamados de “acesos”). Os cabos submarinos têm uma expectativa de vida de 25 anos, durante os quais eles são considerados economicamente viáveis do ponto de vista da capacidade. Ao longo da última década, no entanto, a transmissão global de dados explodiu. Em 2013, o tráfego de Internet era 5 Gigabytes per capita, a previsão é que isso mude para 14 gigabytes per capita em 2018. Obviamente, Esse aumento representa um problema de capacidade, o que exige uma troca de cabos mais frequente. De qualquer maneira, novas técnicas de modulação de fase e melhorias em equipamentos da linha submarina (Submarine Line Terminal Equipment – SLTE) têm impulsionado a capacidade em alguns lugares em até 8000%. Os fios que temos estão mais do que prontos para o tráfego de dados.

Tradução de:

Alexandra Silva, mestranda em Ciência da Computação na Universidade Federal Minas Gerais (UFMG)

Myreli Borba, estudante de informática no Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), apaixonada por aquilo que pode mudar o mundo: tecnologia, literatura e música

Isadora de Menezes, graduanda em Engenharia da Computação na FAT, feminista e apaixonada por tecnologia