Os números não mentem: a área da tecnologia é dominada por homens e isso vem desde as salas de aula. Segundo dados do último Censo da Educação Superior (2013) obtidos pela PrograMaria, a cada 100 estudantes matriculados em cursos de computação no Brasil, apenas 15 são mulheres. E o cenário em outros países não é muito diferente do brasileiro.

Mas nem sempre foi assim. Até meados dos anos 80, a quantidade de mulheres em carreiras científicas nos Estados Unidos estava em plena ascensão quando, de repente, os números começaram a cair drasticamente se mantendo em patamares baixos até hoje.

O que fez com que o interesse feminino em carreiras da computação caísse tanto de uma hora para outra?

O site Smithsonianmag.com levanta uma teoria para esta mudança que traduzimos no texto abaixo.

 


O que aconteceu com todas as mulheres nas Ciência da Computação?

Olga Bayborodova, operadora de computador em seu ambiente de trabalho (1986)

O baixo número de mulheres em cursos de Ciência da Computação pode ter raízes em meados de 1980 com o crescimento dos computadores pessoais

Por Marissa Fessenden, texto original publicado em Smithsonianmag.com

Em 1833, Ada Lovelace, então com 17 anos, conheceu Charles Babbage em uma festa, onde o matemático apresentou à jovem seu invento, a Máquina Diferencial. Nas palavras de Babbage, Lovelace era capaz de compreender “o mais abstrato da ciência… Com a força que poucos intelectuais homens poderiam ter.” O trabalho com Babbage na máquina analítica rendeu a ela um lugar na história da computação – como o primeiro ser humano a programar.

Mas depois de anos desde que Lovelace e outras mulheres pioneiras na programação fizeram seu trabalho, a desigualdade de gênero se tornou gritante: O Centro Nacional de Estatíticas Educacionais (ou National Center for Education Statistics, em inglês), dos Estados Unidos, mostrou que as mulheres eram apenas 18% dos estudantes nos cursos de Ciência da Computação em 2010 e 2011.

Entretanto, entre 1883 e 1984, este número era de 37 porcento. Na realidade, a proporção de mulheres em ciência da computação aumentou constantemente, assim como a proporção de mulheres inscritas em cursos de Medicina, Direito e Física durante o início dos anos 1980. Mas, em 1984, a porcentagem de mulheres na Ciência da Computação caiu drasticamente – basta olhar o gráfico feito pelo site do podcast Planet Money, produzido pela NPR, para entender melhor.

women_STEM

Fonte: National Science Foundation, American Bar Association, American Association of Medical Colleges. Crédito: Quoctrung Bui/NPR

O que aconteceu? A resposta não é tão clara, mas os apresentadores expuseram alguns potenciais fatores. Em meados de 1980, os computadores pessoais entraram nos lares. Mas os tais Commodore 64, Radio Shack TRS-80 (conhecidos no Brasil como CP-300 e CP-500, da Prológica) e outros eram vendidos com apelo ao público masculino. Como relatado no artigo da NPR, não era possível fazer muita coisa nestes primeiros computadores, e eles eram vendidos como brinquedos – máquinas para jogar videogames.

“Esta ideia de que computadores eram para garotos se tornou uma narrativa. Se tornou a história que contamos a nós mesmos sobre a revolução computacional. E ajudou a definir quem eram os geeks e criou a cultura tech.

Então computadores entraram na categoria de “briquedos para meninos”. O acesso e a familiaridade com essas máquinas deu aos meninos uma vantagem inicial em aulas de computação de níveis básicos. Mulheres nessas aulas estavam aprendendo programação pela primeira vez, enquanto homens estavam aperfeiçoando habilidades que desenvolveram por anos. “Eu me lembro de uma vez quando fiz uma pergunta e o professor parou, olhou para mim e disse ‘Você já deveria saber disso.’ “conta Patricia Ordóñez, que frequentou a Johns Hopkins University no início dos anos 80. “E eu pensei que jamais seria boa naquilo.”

A pesquisa sugere que a história de desigualdade de gêneros vem de um efeito bola de neve. Sapna Cheryan, uma psicóloga da University of Washington, em Seattle, investigou como salas de aula decoradas com os típicos “objetos geek”- pôsteres do filme Star Wars, componentes de computadores, latas de Coca-Cola – podem fazer com que mulheres sintam-se como se não pertencessem àquele lugar. O trabalho de Sapna mostrou que mulheres nestes ambientes avaliavam a si mesmas como menos interessadas em Ciência da Computação do que os homens são. A sensação desaparecia em salas decoradas de modo neutro, com plantas e fotos de natureza, como mostra o artigo de Lisa Grossman publicada pelo Science Notes.  

Algumas universidades estão trabalhando duro para mudar essa questão, conforme matéria publicada pelo New York Times. Na University of California Berkeley, um curso introdutório de Ciência da Computação começou a receber mais inscrições de mulheres do que de homens ao trocar o nome do curso e acrescentar disciplinas que fazem correlação entre a programação e do mundo real. Por exemplo, cada aula é iniciada com uma discussão sobre um artigo recentemente publicado na mídia. “Nós revertemos tudo o que afasta as mulheres” disse o professor Dan Garcia ao jornal The San Francisco Chronicle

Fazer com que os níveis em queda no gráfico citado subam novamente é importante. A demanda por engenheiros da computação qualificados é alta. Analisando tendências atuais, cerca de um milhão de postos de trabalho na área de computação não têm alunos em formação para preenchê-las. E nós vamos precisar de mulheres para preencher a lacuna.


fotos: 1. Engenheiras da computação trabalhando nos Supercomputadores Cray em 1983 (Roger Ressmeyey / CORBIS) 2. Olga Bayborodova, operadora de computador. Foto foi tirada em agosto de 1986. (aauw.org)